A temporada de recordes na arrecadação de tributos parece estar com os dias contados. O governo federal já admite que a desaceleração econômica acertará em cheio sua receita e existe a expectativa de que, em breve, venha a anunciar um novo programa de parcelamento de tributos. Fontes do governo dizem que um estudo está em andamento e que ele seria uma espécie de remédio contra a inadimplência fiscal que tende a chegar com a crise financeira. "Quando a situação aperta, as empresas tendem a pagar primeiro seus empregados e fornecedores. O governo é o último no rol de prioridades", analisa Luiz Antonio Benedito, diretor de Estudos Técnicos da Unafisco.
Na semana passada, a secretária da Receita Federal, Lina Veiria, já dava o tom do que estaria por vir. Durante o XI Congresso Nacional dos Auditores-Fiscais da Receita Federal do Brasil (Conaf), realizado em Foz do Iguaçu, ela reconhecia uma "crise sistêmica no sistema do capital", que exigiria "do organismo estatal, servidores de Estado do fisco, respostas suficientes, precisas e adequadas. O País dependerá do acerto delas". E chamava a responsabilidade dos auditores: "Da eficácia da nossa resposta podem depender os empregos de milhares de trabalhadores e o equilíbrio macroeconômico", afirmou.
Logo em seguida, na terça-feira, dia 21, a Receita Federal divulgou a arrecadação de setembro, que mostrou alta no resultado global, mas mostrou queda na Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) de 6,67%, passando de R$ 3,206 bilhões para R$ 2,993 bilhões, entre agosto e setembro. Porém, comparado com setembro de 2007, a contribuição ainda representou aumento de 27,7%.
"As empresas que entram em dificuldade adiam primeiro o pagamento dos governos. Começam a fazer mais planejamento tributário, ou seja, reduzir ao máximo, da forma que for possível por lei, o pagamento de tributos. E isso pode afetar a arrecadação", explicou o economista Amir Khair. No quesito lucro das empresas, o recuo da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) pode ser um exemplo desse movimento. "É normal que em uma desaceleração, especialmente em situação de instabilidade como agora, as pessoas, por receio e insegurança procurem formas de se defender contra crise e protelem o pagamento de tributos e isso reflete no aumento da inadimplência", disse Kahir.
"Se o governo vier com um programa de parcelamento de débitos tributários sinaliza ao mercado uma certa preocupação fiscal, porém maior seriam os efeitos no caso da redução de alíquotas", frisou. Para Khair, uma redução das alíquotas, principalmente do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços (ICMS), por parte dos Estados, no Imposto Sobre Serviços (ISS), por parte dos municípios, e no PIS/Cofins, por parte do governo federal, contribuiria para combater os efeitos da crise.
Segundo o economista, os programas de parcelamento de débito são, normalmente, bombardeadas por críticas. Exemplo disso, foi a reabertura do último Refis, em 2006, quando o então secretário da Receita Federal, Jorge Rachid, resistiu a iniciativa. A época ele disse que o programa era um desrespeito para quem honra com suas obrigações tributárias. "Não é possível a cada dois anos ter um parcelamento especial", completou, lembrando que a Receita já tem um programa de parcelamento regular de cinco anos para quem tem dívidas com o Fisco.
Dos 129 mil contribuintes que aderiram ao primeiro Programa de Recuperação Fiscal (Refis), em 2001, até o mês de agosto de 2008, considerando as exclusões e reinclusões por medida judicial, 12, 5 mil empresas permaneciam no programa. Khair ressalta, no entanto, que os planos elaborados pelos governos (federal, estadual e municipal) não devem perdoar nada, mantendo juros e correção monetária. "É preciso cuidado para não estimular o mau pagador. O essencial é oferecer um prazo mais longo para facilitar a quitação dos débitos", afirmou. E essas práticas, aponta o economista, estão generalizadas nos governos estaduais e municipais.
Para o vice-presidente da Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade (Anefac), Andrew Frank Storfer, o governo não deveria se preocupar com a inadimplência agora. "Se isso acontece, explicita a desaceleração econômica e dificulta ainda mais o capital de giro", alerta. "Em dificuldade financeira, as empresas não pagam os tributos. Mas o que antecede a inadimplência? O crescimento econômico. Essa é a parte preventiva e o remédio é promover a liquidez no mercado", disse.
O professor de Direito da Universidade de São Paulo (USP), Luiz Eduardo Schouer, concorda que com o agravamento da crise a ordem de prioridade dos contribuintes muda, mas não vê no parcelamento de tributos a solução. "Se o governo não mexer na forma como o contribuinte paga os tributos, não adianta promover programas de parcelamento, porque ele não vai conseguir pagar de novo", disse. "Resolver o passado sem resolver o presente é como criar um outro passado", completou o professor da USP.
Fonte: DCI - SP