Uma disputa entre o fisco do Estado de São Paulo e a norte-americana fabricante de softwares EMC, que se arrasta desde 2003, acaba de ter um ponto final. O presidente do Tribunal de Impostos e Taxas (TIT) do Estado de São Paulo confirmou decisão, por maioria, da Oitava Câmara da corte administrativa e livrou a empresa de recolher o ICMS, por entender que o imposto não incide sobre licença de softwares personalizados - produzido sob encomenda. Não cabe mais recurso, pois a Fazenda não pode levar a discussão ao Judiciário.
A EMC foi autuada pelo fisco paulista em valores que, atualizados, ultrapassam os R$ 75 milhões, agora cancelada pelo tribunal. De acordo com o advogado da empresa João Paulo Fagundes, do escritório Rayes, Fagundes e Oliveira Ramos Advogados, esse seria o "leading case" sobre o tema em processos administrativos no Estado de São Paulo e pode servir de precedente para outros casos semelhantes. Apesar de existirem poucas decisões em tribunais superiores, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) e o Supremo Tribunal Federal (STF) têm se manifestado favoráveis à cobrança de ICMS para softwares uniformizados e produzidos em larga escala. As cortes têm apenas excluído o tributo para softwares personalizados.
Segundo a argumentação do advogado da empresa, agora aceita pelo TIT, o ICMS só poderia ser recolhido onde há venda de mercadorias - como o próprio nome do imposto indica - o que não ocorreria com sua cliente, pois haveria apenas a concessão de licenças de softwares. "Não há venda porque o consumidor que adquire a licença de um software e somente tem o direito de usar o programa, não pode copiar ou transferir para outros, já que o programa não pertence a ele", diz.
A empresa perdeu a disputa na primeira instância administrativa, mas ganhou em segunda instância. A Fazenda recorreu ao presidente do tribunal administrativo como último recurso, o que foi rejeitado.
Além de questionar a incidência do tributo, o advogado também argumentou que o fisco estaria cobrando o ICMS de forma indevida. Isso porque a Fazenda passou a entender que, no caso de softwares que já vêm instalados nos computadores (hardware), o tributo incidiria sobre o valor da licença e não sobre o valor do suporte físico - que seria o CD em que o software teria sido gravado. Nesse sentido, haveria um aumento do valor cobrado que estaria em desacordo com a legislação.
O advogado do caso, João Fagundes, também assessora outra empresa de software que está na mesma situação. Autuada em cerca de R$ 15 milhões, a empresa agora aguarda o julgamento pela segunda instância administrativa. "O caso da EMC certamente deve servir de precedente", afirma Fagundes.
O advogado tributarista Miguel Bechara, do Bechara Jr Advogados, também assessora duas empresas de software. Estas, que atuam sob encomenda, estão respondendo a multas de cerca de R$ 300 mil, discutidas administrativamente. "O caso da EMC deve servir como precedente para os casos que assessoro e devo estudar a argumentação usada pelo advogado para ver se seria o caso de acrescentar algum argumento na minha defesa, que também segue a mesma linha", afirma.
Para o advogado Waine Domingos Peron, do Braga & Marafon, a decisão além de ser importante, pode servir de orientação para as empresas do setor. "Acredito que isso possa gerar uma demanda de empresas que optarão por não recolher mais o imposto e, caso seja autuada, recorra administrativamente". Porém, ele ressalta que isso pode ser arriscado, já que as autuações são altas e se condenadas em definitivo, não há um grande prazo para pagar. Para ele, muitas vezes compensa entrar na Justiça com um mandado de segurança para ser liberado do pagamento do imposto, caso não seja de interesse da empresa pagar o tributo, e não correr o risco de ser autuada.
Já o advogado Ulisses César Martins de Sousa, do escritório Ulisses Sousa Advogados Associados, afirma que a posição dos tribunais superiores com relação ao tema já está sendo consolidado. "O assunto já foi bem discutido nos tribunais de forma que os softwares uniformizados deverão ser enquadrados como mercadoria, e por isso, incidiria ICMS e os personalizados como prestação de serviços e, então, incidiria o ISS".
O primeiro julgamento no Superior Tribunal de Justiça, que fez essa distinção, ocorreu em 1997. De lá para cá, ocorreram poucos julgamentos em relação ao tema, que mantêm-se a favor das Fazendas. No Supremo também já há julgamentos de turma favoráveis à incidência do ICMS sobre softwares produzidos de maneira uniforme.
Fonte: Valor Online / Adriana Aguiar